Há tempos, conheci um arqueólogo que se recusava a ler jornais. Dizia que a superficialidade o irritava e o privava de uma visão coerente e continuada de qualquer problemática. Lembrei-me destas palavras no decurso da semana que agora findou, mal ouvi o anúncio público das 96 medidas propostas por Álvaro Barreto para mitigar a terrível dependência portuguesa face ao petróleo.
Sabia o leitor que três dos principais jornais portugueses (o "Diário de Notícias", o "Público" e o "Jornal de Notícias") seleccionaram precisamente a mesma medida: o bloqueio das estradas citadinas aos veículos ligeiros privados? Em 96 medidas, editores e directores dos três jornais consideraram que esta era a medida mais importante e que portanto recolhia o maior número de valores-notícia. Era actual. Tinha implicações na vida de um grande número de pessoas. Era controversa. E era inédita. Estranha sintonia de espírito entre jornais com tão distintas orientações! Não contesto que a medida é relevante, embora rebata o seu ineditismo, uma vez que ela tinha sido anunciada pela candidatura de Pedro Santana Lopes à Câmara Municipal de Lisboa e há muito que se fala na experiência de Londres com estas portagens. Mas confesso que me surpreende a unanimidade. Terá sido induzida? Era esta medida que o proponente desejava realçar? Ou houve apenas um processo de sintonia de mente entre a Avenida da Liberdade, a Rua Viriato e a Rua Gonçalo Cristóvão, no Porto?
Naturalmente, perante esta unanimidade, a sociedade civil cuidou que o plano Barreto se limitava a impor limites económicos à entrada de veículos particulares em Lisboa e no Porto. O público ficou sem conhecer o restante pacote de medidas embora fixe que eram 96 (ai a importância dos números!). As medidas suplementares foram remetidas para o fundo de página ou, pior, foram obliteradas porque o espaço de um jornal não é infinito.
Cumprindo as normas de serviço público, deixo aqui o link para o programa completo anunciado pelo Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho (em formato PDF). Convenhamos que discutir um pacote de medidas tão relevantes, como já vi discutir, sem conhecer todo o cardápio é no mínimo absurdo. Voltarei ao tema ainda hoje.
Para ler o programa de medidas para reduzir a dependência face ao petróleo, pulse aqui.
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