Portugal e Espanha voltaram a invocar clemência da União Europeia (UE) perante as sanções que se abaterão sobre a pesca de lagostim e pescada.
A UE quer reduzir os dias de pesca destas espécies ameaçadas de 22 para 12 por mês. Portugal e Espanha consideram que as actuais restrições já são suficientes.
A UE quer impor seis zonas interditas no Algarve, no Litoral alentejano e na costa sul espanhola. Portugal e Espanha consideram a medida grosseira e desnecessária.
A UE argumenta que as duas espécies estão quase extintas nestas águas e que a sua salvação exige a quase ausência total de pesca. Portugal e Espanha falam em radicalismo. E contrapõem o argumento científico com… a necessidade de mais ciência: os estudos existentes são insuficientes e não devem ser tomados como base para tomadas políticas de posição.
Admito que, na origem do protesto ibérico, estão razões sensíveis: uma ampla frota pesqueira depende destas duas espécies. Com a crise já instalada no sector e com concorrência desleal noutras águas mais permissivas à ilegalidade, é natural que os pescadores ibéricos – e consequentemente as pastas ministeriais que os representam – sintam a aflição própria dos moribundos.
Além disso, dizem as associações sectoriais, a medida vai ter um alcance muito mais profundo. Como as embarcações não se limitam a capturar lagostim, as restrições de dias autorizados para a pesca vão afectar duas a três mil embarcações que também pescam carapau, tamboril ou sarda. O impacte económico será superior ao que Bruxelas estimou, lamentam.
Vamos a número. Segundo dados da Direcção-Geral de Pescas e Aquicultura, das duzentas mil toneladas de peixe pescado em Portugal anualmente, 2.300 correspondem a lagostim e pescada. A UE pede uma redução ibérica de 10%, e a indústria pesqueira queixa-se de que, afectando outras capturas, a medida poderá reduzir o total de capturas em 20%. Infelizmente, não se escutam propostas deste lado da fronteira – apenas queixas.
Qualquer discussão que misture valores de conservação com causas económicas está condenada ao fracasso. A equação nem sequer se coloca a partir do momento em que uma espécie está no limiar da extinção. Pescá-la como se nada fosse é a receita para o abismo. Em cinco, dez, quinze anos, não haverá lagostins deste lado do oceano. De nada vale insultar os esforços proteccionistas, nem as vozes conservacionistas. Como um miúdo, apetece dizer que não foram eles que estragaram. Já estava assim quando chegaram!
O fim dos stocks pesqueiros é, porém, um problema de contornos complexos. Em primeiro lugar, porque a imensidão dos ecossistemas torna difícil os esforços de conservação integrada – fora da jurisdição da UE, quem impõe práticas e limites aos pescadores? Adivinha-se um fartar vilanagem de todo injusto para quem cumpre e que sofre precisamente porque cumpre.
Além disso, o desemprego no sector das pescas é genuíno. Não é exagerado, nem fruto de um aproveitamento imoral de apoios sociais. Olha-se para Sesimbra, Espinho ou Madalena do Pico e é desolador ver os barcos em terra, os homens, indolentes, a passar o tempo, o peixe nos restaurantes importado de outras águas.
A reconversão do sector pesqueiro nunca foi programada – e essa é uma responsabilidade transversal de vários executivos. Nunca se promoveu a eficiência das frotas, nunca se preparou os profissionais para outras actividades. Costuma-se dizer que um ministério marca o grau de desenvolvimento da respectiva actividade que enquadra. É bem possível que ao novo ministro da Agricultura, Pescas e Floresta esteja apenas reservado o papel de coveiro da pesca nacional.
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