sábado, março 12, 2005

Problema Porcino



A suinicultura é uma actividade tradicional em Portugal. Ninguém o contesta. Mais: segundo o decreto-lei 100/2002, as explorações portuguesas são inferiores à média comunitária, movimentam menos animais e geram menos capitais. Pior ainda: 50% das explorações concentram-se em 5% do território, o que provoca dependência regional excessiva do sucesso ou insucesso da criação de porcos. Alicerçadas nesta conjuntura que dificilmente mudará, as associações do sector têm-se candidatado a fundos nacionais e europeus que visam compensar as suas dificuldades estruturais.
Julgo que ninguém contesta a atribuição de fundos compensatórios aos suinicultores, sobretudo às pequenas explorações que provavelmente mal chegam para pagar as contas. Da parte que me toca, fico encantado for ver alguém ainda dedicado ao sector primário no nosso país de serviços. Que sejam então os porcos o motor do desenvolvimento! Mas a equação tem de ser dada a conhecer com todos os dados, sob risco de chegarmos a conclusões falaciosas. E a verdade incontestável é que estas explorações – pequenas e grandes – provocam terríveis impactes ambientais. Os dejectos das suiniculturas contaminam solos e sobretudo cursos de água. Sem tratamento, os efluentes são uma das principais causas para a degradação ambiental regional.
Aos poucos, avançámos, admito. Há uma geração, os responsáveis das suiniculturas não admitiriam sequer os danos provocados pelas suas explorações. Hoje em dia, são as próprias associações do sector (ver por exemplo o site da Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores) que reconhecem a necessidade de adopção de sistemas integrados de tratamento. Mas quem os paga?
O princípio do poluidor-pagador é suficientemente claro e directo para evitar subterfúgios. Cabe sempre às explorações encontrar formas individuais ou concertadas de limpar o que sujam. Mas aí verdadeiramente é que a… porca torce o rabo. A avaliar pela notícia publicada no “Jornal de Notícias” de quinta-feira, um sistema integrado de tratamento em Palmela custa 33 milhões de euros. Tem capacidade para descontaminar os efluentes de 317 explorações e cerca de 230 mil porcos (segundo dados oficiais de 1999, a média portuguesa cifra-se em 18,3 cabeças por cada exploração – lamento, mas não tenho a estatística actualizada).
De acordo com a notícia, a associação local, enquadrada pela Associação Livre de Suinicultores, está disposta a cobrir 70% dos custos, como manda a directiva comunitária, desde que o Estado arque com os 30% restantes. Aliás, de forma pioneira, os criadores locais pretendem pagar parte da sua factura, apostando num modelo de produção gradual de biogás que, ligado à rede de distribuição da EDP, gere algumas receitas.
Entretanto, perante estes sinais positivos dos parceiros económicos, o Estado assobia para o ar, encolhe os ombros e faz de Pilatos.
Entendamo-nos: temos o direito de exigir aos suinicultores o cumprimento da sua responsabilidade ambiental, salvaguardando a viabilidade económica do sector. Depois de um longo processo de “conversão” de mentalidades, é hoje consensual que a actividade polui e exige soluções caras e complexas. Alguns criadores de suínos estão mesmo dispostos a pagar a sua fatia, enquanto outros esperam para ver. E no final de todo este processo, o Estado, que deveria aceitar de braços abertos a proposta e encorajar outros a adoptar a mesma atitude, falha a sua missão e discute o preço. Depois não se queixe.

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