Arquivo da Biblioteca Nacional do Brasil. Projecto Jornais Extintos |
[Crónicas hospitalares] Encostado à
boxe para recauchutagem da máquina, encontrei, em leituras
improváveis, um dos mais fenomenais empastelamentos da imprensa lusófona. O
pastel, ou empastelamento, era o pesadelo dos tipógrafos — a junção inadvertida
de dois textos diferentes. Aconteceu em 1908 na Gazeta de São João da Boavista, Brasil. Noticiava-se a
partida para o Rio de um médico estimado em Goiás e a notícia foi poluída pelo
anúncio de um certame zootécnico marcado por um porco de dimensões generosas. Transcrevo:
«Parte hoje para o Rio de Janeiro, onde demorar-se-á alguns meses, o
nosso querido amigo, dr. José da Silva Mattos.
É um dos melhores exemplos de suínos que temos visto, attingindo o seu
peso, caso entre nós nunca visto, a 168 kilogrammos.
Os seus numerosos amigos, querendo demonstrar quão sensível lhes será a
ausência do estimado clínico que vae remetido para a Exposição Nacional onde
certamente ganhará um dos prémios destinados a animais do ceva, demonstrando os
cuidados que dispensava com sua carinhosa presença aos seus enfermos,
attendendo a qualquer hora do dia ou da noite os chamados por maior que enche
de orgulho os criadores goyanos certos de que esse representante da zootechina
do município na Capital attestará o adiantamento de operoso clínico que deixa
fundas saudades entre nós com sua retirada, felizmente não longa.
Teremos a maior satisfação e prazer em vel-o esquartejado, vendido a
peso seu toucinho dando razoável e compensador lucro a todos os seus amigos.»
Ponto de partida: Memórias de um Repórter, Tomé Vieira, Lisboa, s/ data.
2 comentários:
Gonçalamigo
Ainda não consegui deixar de gargalhar; há empastelamentos e...empastelamentos. Este é o melhor que algum dia podia encontrar!
O Tomé Vieira foi um grande Jornalista. E trabalhou no "verdadeiro" DN. Dá gosto esta Memória. :-)))))))))))
Abç do Pernoca Marota
E muito obrigado por me teres aturado um tempo sem fim... na "Flor do Lumiar", passe a publicidade...
Caríssimo Henrique,
Foi um prazer entrevistar-te e ouvir-te sobre a década brilhante da rubrica Internacional num jornal de referência como o DN foi (ainda é?) – já para não falar das pequenas anedotas.
Hoje, enquanto a televisão cá do sítio debitava a astróloga de serviço, dei por mim com a recordação do Huros-Copo do Diário Ilustrado e da maneira como ele se construía. Vou passar agora ao papel a nossa conversa. Darei notícias.
Forte abraço.
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