Fartamo-nos de sentenciar que acabou o
tempo do jornalismo de investigação. Que o tempo de pesquisa, processamento,
reflexão e publicação ou difusão já lá vai. «Jornalismo imediato», prega o spot de uma televisão. Não é um diagnóstico vão. Ele é
válido para quase todos os jornalistas e para quase todos os órgãos de
comunicação que conheço – por motivos válidos e dificilmente removíveis, entenda-se. Mas eu
conheço pelo menos um tipo com um brio invulgar.
A reportagem que publicamos amanhã sobre o
lince-ibérico poderia ter sido concluída em Dezembro, com a libertação
simbólica dos primeiros linces num recinto controlado. Ou em Outubro de 2014
quando as notícias sobre o sucesso de reprodução e sobrevivência em cativeiro eram
muitíssimo animadoras. Ou mesmo em Março deste ano quando as primeiras
libertações de animais em ambiente totalmente selvagem tiveram lugar. Para o
Luís Quinta, faltava mais uma imagem. Mais um dado.
Perturbou metade da população da serra de
Monchique em busca de informação, de rumores de avistamento. Foi para Vila Nova
de Milfontes há mais de dois anos e descobriu um lince solitário, conhecido e tolerado por caçadores e população local, mas bem fora da área onde era suposto viver. Uma espécie de Tom Sawyer entre os linces, portanto. O Luís chateou coleccionadores privados que guardavam
exemplares de linces caçados há décadas [num caso, um lince quase contemporâneo
do 5 de Outubro de 1910]. Pediu dados à equipa de monitorização. Esperou por
autorizações. Obteve dados inéditos sobre movimentos dos linces. Esta era uma
das histórias que o Luís não queria falhar. Queria contá-la sem hipérboles. Só
os factos – dados de conservação, ameaças reais, desafios de investigação,
incógnitas.
Há fotografias na reportagem que
publicamos amanhã que demoraram semanas a preparar. Há uma, particularmente
deliciosa, na qual o Luís juntou uma imagem de câmara accionada por controlo
remoto com o vigilante que tem a missão de verificar todos os dias os vultos
que possam ter sido captados fortuitamente por esses dispositivos. Foi ele que, numa bela manhã de 2013, encontrou uma imagem inesperadamente bela na memória do equipamento. Teria sido
tão fácil fotografar só o vigilante. Ou um vigilante. Ou publicar só a imagem a
preto e branco do animal surpreendido naquele instantâneo fantasmagórico.
Nenhuma contaria tão bem a nossa história como aquela que o Luís preparou e
obteve (Não a mostro de propósito para vos forçar a procurá-la na revista!).
O jornalista Baptista-Bastos escreveu
certa vez, no final de uma reportagem: «Ouvi dizer, aqui há muitos anos, que
uma história começa quando os outros se surpreendem.» Vejam amanhã as fotografias do
Luís Quinta e surpreendam-se. Então, sim, espero que estejam prontos para a
história.
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