"Diário Popular", 22/09/1967 (a partir de arquivo da Biblioteca Nacional) |
O jornalista Adelino Cardoso morreu
esta semana. Não há melhor homenagem a um jornalista recto, creio, do que
recordar uma das suas peças. Descrito frequentemente como literatura apressada,
o jornalismo consome textos como a locomotiva ingere carvão – processa-os;
publica-os; esquece-os porque a máquina infernal precisa constantemente de mais
alimentação e não guarda lembrança do carvão já queimado.
Durante a semana, Adelino Cardoso foi
recordado pela sua conduta irrepreensível no acompanhamento da actividade
parlamentar nas décadas de 1970 e 1980. Não duvido do que se escreveu. Mas há
um texto dele que me marcou mais. Foi escrito em Setembro de 1967 para o número
do 25.º aniversário do "Diário Popular".
Após oito anos de carreira noutros jornais, frustrado
pela prática que «o amodorrava à banca de jornais, onde pouco mais era possível
que amortalhar-me nas águas paradas do 'não vale a pena'», Adelino Cardoso
decidiu recomeçar do zero. Soube de um concurso para admissão de jornalistas do
Diário Popular e participou. «Há coisas que não se agradecem, mas se há alguma
coisa a que devo estar reconhecido é ao facto de o jornal ter aceite esse
pecúlio [uma experiência tarimbeira de oito anos sem encostos e sem referências
que não fossem as dos camaradas de ofício] como o único que de facto
interessava colocar na balança das minhas probabilidades», escreveu mais tarde.
Este texto intitula-se "Um
desafio a mim próprio" e é uma das mais pungentes homenagens ao jornalismo
da década de 1960 e às suas rotinas.
A fornalha do “Diário Popular” apagou-se
há muito. Adelino Cardoso foi um dos operários que melhor a alimentou. É essa a homenagem que lhe faço.
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