Julgo que é relativamente consensual que temos uma boa lei de imprensa. Abrangente e actualizada, ela deveria ser o instrumento apropriado para regulamentar e delimitar a prática jornalística em Portugal. Delimitar, ela até delimita. Mas a sua aplicação chega a ser risível, espécie de espelho da nação, perfeita na forma mas imperfeita no conteúdo.
Instituiu-se, e bem, que os profissionais habilitados a exercer a profissão deveriam ser detentores de um título profissional. Assim se regulamentaria a profisão e se subordinaria os jornais e jornalistas ao código deontológico e às normas profissionais. O escrutínio da medida, porém, deixa a desejar.
Nos grupos de comunicação por onde fui passando, conviviam alegremente profissionais encartados e profissionais sem carteira profissional. Não por malícia ou artimanhas, sublinho. Simplesmente, a inércia levava a melhor e a regularização das suas situações profissionais ia sendo progressivamente adiada.
Diz a lei que todos os jornalistas devem deter o respectivo título até porque, ao abrigo da lei, eles são judicialmente responsáveis pelos textos que produzem.
Questão pertinente: como se responsabiliza alguém que não se conhece, que não está inscrito em qualquer associação profissional e sobretudo cujo nome, por acidente, é igual ao de outros profissionais?
Na era da interactividade, não resisto a propor um divertido exercício. Ora, vá à página da Comissão da Carrteira Profissional de Jornalistas (www.ccpj.pt). Folheie as páginas com os nomes dos profissionais inscritos (a lista é pública, não se envergonhe). Depois, lembre-se dos seus jornais e revistas favoritos. Prometo recompensas se, a cada três títulos, não encontrar pelo menos um com jornalistas fora da lei.
A lei até é relativamente boa, repito. Mas o legislador esqueceu-se que Portugal ainda é um posto avançado do Norte de África.
2 comentários:
Pois, concordo com quase tudo, mas acho importante acrescentar que há critérios (para a atribuição da carteira) que acho dubios e inadequados. De acordo com os artigos 1º e 2º do Estatuto de Jornalista só podem ser jornalistas aqueles que "provem fazer do jornalismo a sua actividade principal, permanente e remunerada." Fica por saber o que é que se entende por "actividade principal". Será aquela que consome mais tempo? Que rende mais dinheiro? Que exige maior empenho? Por outro lado,com este artigo exclui-se a possibilidade de haver jornalistas no desemprego, já que assim que deixam de ser remunerados, deixam também de ser jornalistas...
Estas são apenas duas das muitas fragilidades que na minha opinião existem na portaria que regula o estatuto de jornalista.
Jornalista com a carteira nº 6218
Subscrevo inteiramente a adenda.
Enviar um comentário