Frontline, "The Suicide Plan", 2012, © PBS
(INFELIZMENTE, POR QUEIXA RELACIONADA COM DIREITOS DE AUTOR, ESTE VÍDEO TEVE DE SER REMOVIDO DO YOUTUBE. LAMENTO.)
(INFELIZMENTE, POR QUEIXA RELACIONADA COM DIREITOS DE AUTOR, ESTE VÍDEO TEVE DE SER REMOVIDO DO YOUTUBE. LAMENTO.)
Desafio-o a reservar uma hora para ver este documentário do Frontline dedicado ao debate sobre o suicídio assistido (como de costume, as legendas são da minha autoria, pelo que peço antecipadamente desculpa pelos erros de sintonia entre texto e imagem). Não é uma abordagem jornalística tradicional, no sentido em que não assume que estamos na fase de discussão pública entre a aceitação da prática e a sua recusa absoluta.
O documentário parte da premissa de que essa fase já passou. Assume que, para muitos cidadãos americanos (e portugueses?), não é viável esperar pela clarificação absoluta da lei, pelo que o ponto de partida do documentário é expresso noutro enunciado, a saber: que grau de autonomia de decisão deve a lei assegurar ao cidadão consciente que quer terminar a sua vida nos seus próprios termos?
O debate ético, filosófico, moral e religioso interessa-me menos do que a discussão jornalística e aqui há elementos para um debate aprofundado sobre a adequabilidade das normas de objectividade à prática jornalística moderna, sobretudo nestes temas de fronteira nos quais se discute o direito à vida, o exercício da medicina e os direitos civis de cada indivíduo.
Os autores do documentário superam o tradicional impasse provocado pela aplicação das normas de objectividade ao desempenho jornalístico. Num guião tradicional, esperar-se-ia que os repórteres escutassem igual número de defensores e críticos do suicídio assistido (que, a propósito, não é eutanásia, no sentido em que em nenhum momento o doente transfere a responsabilidade do acto para outro – aqui, é sempre o doente que executa o acto, ou actos, que levam à sua morte), sem penderem para nenhum dos lados da contenda.
A equipa do Frontline parece ter superado a questão, despindo a pele do observador não participante que a ideologia da profissão nos sugere/impõe, por troca com as roupas mais confortáveis, mas mais perigosas, do participante justo, que avalia os argumentos da contenda, que os pesa, que os expressa na reportagem, mas que não tem receio de atribuir mais proeminência a determinados pressupostos.
Note-se, paradoxalmente, que, ao longo da reportagem, não se adivinha a opinião do(s) jornalista(s). Ali, não se advoga a militância por uma causa, mesclando informação e opinião, como tantas vezes se vê. Chegamos ao fim do documentário sem ter ouvido do repórter um adjectivo, à excepção talvez do rótulo "radical" aplicado ao grupo Final Exit.
Em contrapartida, ao longo dos sucessivos testemunhos de médicos, familiares, doentes, representantes do sistema legal e agentes da ordem, o debate vai sendo recentrado naquilo que se torna a nova questão de fundo: Onde pode ser colocada a fronteira entre o desejo do invidíduo de colocar fim à sua vida nos seus próprios termos e a responsabilidade estatal de garantir que a sociedade se mantém humana e responsável, sem banalizar o direito da vida?
É admissível aceitar, como nos estados de Washington e Oregon, que o suicídio assistido seja autorizado a doentes em fase terminal?
Deve o privilégio ser alargado a doentes sujeitos a dor crónica, sejam eles, ou não, portadores de doença terminal?
Ou, em alternativa, pode qualquer indivíduo lúcido e consciente dos seus actos decidir que chegou a sua hora, independentemente do quadro clínico que possa registar?
O debate está em aberto e aberto ficará. Mas parece-me que estas reportagens abrem uma alameda de possibilidades metodológicas ao jornalista, que exigem um debate rigoroso no seio da profissão, até porque a fronteira entre o "participante justo" e o "activista mobilizado" é igualmente ténue.
5 comentários:
muito obrigado por todo o esforço de tradução!
Eu é que agradeço a atenção. Como digo em cima, é um esforço amador de tradução com o objectivo de tornar a informação mais perceptível.
Um abraço.
Gonçalo, parabéns pelo fabuloso blogue (recomendado por um amigo, ora veja-se)duas curtas notas:
1. O tópico central aqui não é se o suicídio assistido é moral ou não. O tópico é se a "assistência" é moral e, mais importante, se é legal, pois em questões de moral já se viu há muito tempo que cada um tem a sua, não é? Sendo que acho toda a questão um pouco redundante, dado que, por um lado a)estudando a fauna pululante que publicita e a morfologia habitual dos debates em redor destas questões em Portugal, em geral acabamos todos algures entre as decisões do Concílio Vaticano II e as Orbi et Urbi do ex-Cardeal Ratzinger; por outro lado, b) em cada esquina das nossas cidades, hoje vendem-se, a preços populares, potentes e (dizem-me) deliciosos cocktails de drogas que nos fazem ascender aos céus num ápice e, se em quantidades suficientes, nos deixam ficar lá de vez. Não são bem como a bebida da Florbela Espanca (investiguei) mas não andarão lá longe. Logo, a questão da "assistência" no suicídio só se coloca a quem não tem a capacidade mental ou física de ir comprar os bens à esquina;
2. Aprecio a preocupação metodológica e a sensabilidade deontológica quanto à postura - propositura? - dum/duma jornalista em relação a esta e outras questões quando faz o seu trabalho. Mas não se preocupe tanto. Como consumidor nato e com décadas de experiência a consumir notícias e análises, consigo facilmente descobrir quem vem e ao que vem, calibrar as posturas e perceber o grau de neutralidade do produto. Especialmente num tópico como este, o trigo e o joio são relativamente fáceis de identificar.
ABM
Por favor disponibilize aqui pelo menos apenas a sua legenda para download, assim outros podem assistir com o documentário, que é possível encontrar por torrent. Ou se preferir coloque em sites de legenda...
Prezado Nagol,
Envio-lhe de bom grado o ficheiro de legendagem se me fornecer um endereço de email para onde eu possa remeter o documento.
No modelo do blogue, não consigo incluir o ficheiro de legendagem.
Um abraço.
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