quinta-feira, agosto 17, 2006

Não, Não e Não!


"Nixon's motto was: If two wrongs don't make a right, try three." – Norman Cousins (sobre Richard M. Nixon)

Admiro a persistência do arquitecto Sidónio Pardal, mesmo discordando genuinamente das propostas que ele insistentemente tem feito para modificar o regime de administração sobre as áreas incluídas na Reserva Ecológica Nacional (REN) e Reserva Agrícola Nacional (RAN). Há anos – há décadas – que o professor Pardal batalha pela transferência da tutela destas áreas para os municípios. Por outras palavras, de acordo com o modelo do arquitecto, seriam os Planos Directores Municipais (PDM) os únicos instrumentos para definir a regulamentação dos usos do solo e as autarquias as únicas entidades legitimadas para avaliação.
Há uma maneira simples de encarar esta proposta: o leitor confia cegamente nos 306 presidentes de municípios portugueses? Confia que todos – não apenas alguns, mas todos! – os autarcas decidiriam convenientemente que áreas dentro dos seus municípios deveriam continuar delimitadas pela REN ou pela RAN e que excepções de inegável interesse público poderiam ser desenvolvidas?
O professor Pardal acredita que a RAN – e depois a REN – facilitaram a perversão de todas as outras áreas não contempladas pelas reservas. Até admito que sim. Que tudo o que escapou às áreas seleccionadas nos diplomas originais ficou, desde logo, sob ameaça. Concedo ainda que os estatutos jurídicos da REN e da RAN necessitam de revisão. Não faz muito sentido que as restrições de actividades nas zonas protegidas sejam indistintamente aplicadas de norte a sul, sem tomar em conta especificidades regionais e actividades tradicionais há muito enraizadas. Não nos iludamos porém: ainda bem que a REN e a RAN são travões ao desenvolvimento urbano. Ainda bem que há municípios que se queixam que a REN e a RAN tornam a gestão do território ingovernável. É sempre bom sinal.
Neste país, o desenvolvimento urbano mede-se em betão. Reconheço que manchas de terreno destinadas a assegurar a «protecção de recursos essenciais para a preservação do equilíbrio ecológico e de uma estrutura biofísica básica» sejam frustrantes para os autarcas. Definitivamente, onde elas existem, poderiam facilmente erguer-se centros comerciais, urbanizações, estádios e demais obras de inegável interesse público. Fontes de receita para as autarquias endividadas e telas ainda vazias onde poderiam já estar monumentos ao desenvolvimento regional. É ir a Oeiras ver o desenvolvimento regional em pleno!
Há dois anos, quando a proposta de Sidónio Pardal chegou ao ministro Nobre Guedes, foi decisiva a condenação unânime do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Na oposição, o promissor ministro-sombra do Ambiente, Pedro Silva Pereira, ergueu a voz e anunciou [cito de memória] que a proposta subvertia a Lei de Bases do Ordenamento do Território e que só um Ministério do Ambiente fraco permitiria que isto sucedesse. Era um golpe de estado ambiental, queixou-se.
Hoje, Sidónio Pardal volta a encontrar no “Público” [outra vez, santo Deus, outra vez!] a tribuna para expressar a sua arenga. Não tenham dúvidas, meus senhores. A batalha da REN e da RAN terá novas escaramuças.
Afinal, há mais legislaturas do que marinheiros.

2 comentários:

pamacedo disse...

é... acho que escolheste bem o exemplo da imagem: reserva ornitologica de mindelo.
Na RAN construiu-se a Infineon (mega fabrica de semicondutores), a Lactogal (mega unidade de lacticinios) e o Nassica (mega centro comercial). A zona industrial continua com muito espaço vazio...
Na REN constroem-se condominios de luxo, "na primeira linha do mar"...
Exemplos nao faltarão pelo pais todo, mas poucos sitios terao este historial de atentados ambientais perpetrados pela camara municipal. Sem paragem à vista...

Gonçalo Pereira disse...

O Mindelo já teve, de facto, a sua quota-parte de excepções!